Regiões de Salvador que dispõem de geografia única, contornadas pelo mar calmo da Baía de Todos os Santos, passam a ser alvos do mercado imobiliário
Por Wagner Ferreira – Herança histórica dos anos de ouro da vida social noturna da Bahia, o Clube Fantoches da Euterpe resiste à especulação imobiliária instalada no Centro Antigo de Salvador nos últimos anos. Mas, como um câncer “modernizador”, propostas de compra chegarão até ele em breve.
Com os metros quadrados mais caros da cidade já ocupados há séculos pela nobreza baiana, os “novos ricos”, ou “emergentes”, buscam áreas antes decadentes ou ignoradas pelo grande capital para ocupar. Desfrutar do melhor pôr do Sol e da vista privilegiada ao acordar, sem abrir mão da segurança, claro.
Áreas remanescentes de mata atlântica às margens da Avenida Luís Viana Filho (Paralela) e com vista para a Baía de Todos os Santos na Gamboa, 2 de Julho e Subúrbio Ferroviário de Salvador, pouco a pouco, têm recebido obras estruturantes do Governo da Bahia com o intuito de ser mais um espaço preparado para os bem abastados, mas desprovidos de títulos nobres e fidalguia.
Acessos alternativos foram abertos pelo poder público, criando, assim, um corredor exclusivo, que fuja do itinerário comum dos moradores dessas regiões, ainda que sob o argumento de valorização da periferia e seus moradores. “Teremos uma redução significativa no tempo de deslocamento dos moradores de todo Subúrbio Ferroviário, o que significa mais qualidade de vida. Antes, só era possível chegar em uma estação do metrô fazendo o trajeto entre a Suburbana e o bairro do Retiro ou Acesso Norte, que leva mais de uma hora nos horários de maior fluxo de veículos. Agora, será possível chegar à Estação Pirajá em menos de 10 minutos”, justifica o diretor de Infraestrutura e Edificações Públicas da Coordenação de Desenvolvimento Urbano da Bahia (Conder), Francisco Fonseca
Quem vai da periferia ao centro é, na maioria das vezes, para trabalhar ou utilizar de serviços que lá existem e são parcos nos bairros distantes, e não o contrário.
Já a relação de interesse dos moradores de regiões consideradas nobres ou de classe média com a periferia é exótica. Pessoas com perfil mais alternativo em busca do novo espaço modinha (O restaurante Boca de Galinha, em Plataforma, é um exemplo) com programação diferente da encontrada nos espaços badalados de Salvador.
Novas vias e modais – Ligações como a Lobato-Pirajá, Avenida 29 de Março – que tem em uma das suas margens o condomínio de luxo Alphaville 2 e, mais recentemente, o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), serviço que passa de 0,50 centavos para R$ 4,20 (com a integração com o ônibus e metrô) primeiro dispositivo excludente de classes, além da desapropriação de imóveis próximos às obras, que reutilizará parte do trajeto do antigo trem do Subúrbio.
Gamboa, 2 de Julho, Subúrbio de Salvador e Itapagipe são regiões de Salvador que dispõem de geografia única devido à proximidade do mar calmo da Baía de Todos os Santos. Desses lugares, Gamboa e 2 de Julho vem sendo ocupado por quem pode pagar de 3 a 6 milhões em média por um imóvel que, ao abrir a janela o proprietário é presenteado, todos os dias, por uma obra de arte. Vantagem que os antigos moradores já tinham, talvez parte não desse tanta importância, por achar aquilo tão natural, não se dava conta que nos dias de hoje algo tido como banal em tempos passados fosse objeto de desejo de quem pode pagar pelo melhor espaço.
Nessa lógica, não tarda chegar às “Terras Baixas” os que acham que pobre não tem o direito de ter uma bela vista. Especulação, desapropriação em nome do “interesse público” são as armas desse povo, que com apenas uma unidade dos seus suntuosos imóveis compram centenas de casas em Itacaranha, Lobato, Ribeira, Paripe, entre outros bairros, e patrocinam passagem só de ida para conjuntos habitacionais com o mínimo de estrutura às margens da BR 324.
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